Meninas e meninos,
Pato no Tucupi e vinho brasileiro é a minha lembrança de uma das mais difíceis harmonizações já ocorridas em minha confraria Taninos no Tucupi, só que não: aliás, o nome da confraria resultou desta harmonização que ocorreu no restaurante Tordesilhas da Chef Mara Salles, e que ainda hoje é o nosso ponto de encontro. A foto do prato Pato no Tucupi tem crédito de João A. F. Queiroz.
Mas me lembrei desta harmonização de 2010 dentre outras tantas harmonizações ocorridas na confraria Taninos no Tucupi em virtude de ter lido no jornal Folha de São Paulo sobre o evento Culinária Tapajós que começará amanhã e irá até sexta-feira, dia 16 na cidade de Alter do Chão, distante de Santarém cerca de 40 Km.
Nestas degustações que fazemos com gastronomia regional brasileira e vinhos, experiência magistral, diga-se de passagem, eu tenho aprendido muito. O prato, perpetrado pela amiga Mara Salles, do Restaurante Tordesilhas, o Pato no Tucupi típico da cozinha regional do norte do país, preparado especialmente em ocasiões festivas como o Círio de Nazaré, por exemplo, que ocorre em Outubro em Belém do Pará.
O pato é marinado em meio ácido, segundo a Mara, assado e depois mergulhado no molho de tucupi, que vem a ser um caldo amarelado feito da mandioca brava, que é descascada, ralada e espremida tradicionalmente usando-se um tipiti, uma comprida e fina cesta trançada à mão, com duas argolas nas pontas, e que depois de cheio da massa da mandioca, é espremido usando-se dois pedaços de madeira nas argolas, um girando para a direta e outro para a esquerda, extraindo o caldo e deixando a massa seca em seu interior. Depois de extraído, o molho “descansa” para que o amido se separe do líquido.
Inicialmente venenoso devido à presença do ácido cianídrico, o líquido é cozido por horas, e com este processo, elimina-se o veneno, podendo, então ser usado como molho na culinária.
Levado ao tucupi, o pato junto com o jambu, erva que provoca dormência nas papilas gustativas, é servido com farinha d’água e pimenta de cheiro. Fácil de harmonizar não acham?
Para começar, ainda tivemos a entrada de Tacacá, um caldo com tucupi, a goma da mandioca tapiocada, jambu e camarão seco, que ficou ótima com um Sauvignon Blanc da Nova Zelândia.
Os vinhos que levamos foram:
1-Marson GR Cab.Sauvig 2002-Brasil
2-Dom Laurindo Tannat-Brasil
3-Baron de Lantier Cab Sauvignon 1991-Brasil
4-Dal Pizzol 35 anos assemblage-Brasil
5-Avondale Pinotage 2008-A.do Sul
6-Le Cepages 2007 Cab Sauv/Merlot-Roca Maura- Sul da França
7-Cordilheira de Santana Gewurztraminer 2008-Brasil
8-Jeam Luc-Rose de Syrah 2006-França
9-Chateneuf du Pape 2006 –Xavier-França
10-Daremberg Riesling 2008-Austrália
11-Avondale Chenin Blanc 2009-.A do Sul.
Sempre pensamos na harmonização com o prato principal, no caso, Pato no Tucupi, porém não deixamos de escolher o vinho que mais agrada solo, e também com outros pratos apresentados, mas segue aqui apenas a impressão do vinho que mais agradou na harmonização com o Pato no Tucupi.
Para minha alegria, o grande vencedor, mostrando que minha predileção pelos bons vinhos Brasileiros tem razão de ser, foi o mais decano deles, o Baron de Lantier Cabernet Sauvignon 1991, que, diga-se de passagem, é pela segunda vez muito bem posicionado em degustações onde participo.
Foi seguido bem de perto pelo também Brasileiro Marson Gran Reserva Cabernet Sauvignon 2002 e o Chenin Blanc. Logo depois, outro Brasileiro, o Tannat da Dom Laurindo. Pelas minhas notas arredondadas pelo critério adotado, além do Baron de Lantier também o branco Riesling Australiano foram os mais pontuados por mim.
Um pouco da história deste vinho, segundo seu criador, o enólogo Adolfo Lona, em e-mail enviado ao tanineiro Agilson Gavioli.
“Te envio alguns dados, chamando a atenção a que o resultado foi consequência de três fatores:
1. Comportamento excepcional do clima em comparação ao normal de todos os anos como se observa no quadro abaixo. Algo mais de 100 mm de chuva nos meses pré-colheita foi maravilhoso.
2. Dispor dos mais avançados e adequados recursos tecnológicos como uma desengaçadeira, importada especialmente que retirava o engaço sem machucá-lo e deixava os grãos inteiros, maceradores em aço especiais construídos especialmente para retirar os componentes da cor provocando o menor atrito possível entre as cascas, barricas de carvalho francês novas com duelas serradas (foram as primeiras existentes no Brasil).
3. Conceito de elaboração que determinava que os tempos seriam dados pelo vinho e não pela equipe técnica. Por isso ficou doze meses nas barricas e envelheceu dezoito meses na garrafa. Somente após estes tempos consideramos que estaria “pronto para o consumo”.
A colheita foi de 17 de Fevereiro a 22 de Março de 91 e o álcool potencial das uvas era quase 12%, fato inédito.
Da safra 91 a De Lantier elaborou 321.000 litros entre Cabernet Sauvignon e Merlot dos quais se reservaram somente 100.000 litros. O Corte final estava composto de 85,5% de Cabernet Sauvignon e 14,5% de Merlot.
As etapas do ciclo de produção foram:
Colheita e elaboração: de Fevereiro a Junho de 1991 (maceração de oito dias, fermentação, maloláctica). Pré-maturação em tanques: Julho a Dezembro 1991.
Maturação em barricas de 225 litros: janeiro de 1992 a Janeiro de 1993. Descanso pós barrica: Fevereiro a Maio 1993
Engarrafamento: de 17 a 19 de Maio de 1993.
Lançamento antecipado para confrades para possibilitar acompanhar a evolução: Julho 1994. Lançamento oficial: Outubro de 1994.
O CS 91 foi o primeiro vinho exportado para o Canadá onde a escolha dos vinhos autorizados a serem comercializados no país resulta da premiação no Concurso Internacional.
Comprovar que este vinho brasileiro elaborado com uvas colhidas há quase vinte anos( à época da degustação na confraria)e engarrafado há exatamente 17 anos, permanece “inteiro” é algo que ainda me surpreende”.
Grande abraço
Adolfo Lona
Recordar é viver, e agradeço sempre ao querido Adolfo Lona e a não menos querida Mara Salles
Até o próximo brinde!
Álvaro Cézar Galvão