Meninas e meninos,
Oscar Gugliemone e sua Adega Medieval não podem ser esquecidos na história da vitivinicultura brasileira. Seus vinhos elaborados rudimentarmente, mas com maestria, pureza, higiene, eram, segundo relatos, mais para receber seus amigos e conversar petiscando embutidos regionais.
Eu já tive o privilégio de degustar seus vinhos, o famoso Nebbiolo, citado em diversas publicações, e o Merlot, ambos 1985, e estavam íntegros na data, em Novembro de 2016, conforme relatei no site Divino Guia. Mas o que me motivou a voltar ao Oscar Guglielmone e à Adega Medieval foi um surpreendente texto inédito do meu querido mano Ennio Federico, amigo do Guglielmone, a ponto de receber um dos poemas do vinhateiro e filósofo de Viamão-RS.
Vejam que foto primorosa, e leia o texto.
Antes, me permito mencionar um pouco do Ennio, colunista das principais revistas de bebidas e gastronomia, de sites e blogs que iniciavam as postagens sobre estes temas. Amante da boa cozinha, e cozinheiro de mão cheia, Ennio Federico foi professor de muitos de nós(aqui eu me incluo) na arte da enogastronomia, das degustações vínicas e dos destilados.
Ennio conhece como ninguém as bebidas, apreciador e dileto conhecedor dos caminhos da elaboração ao copo. Pertence aos primórdios da SBAV-Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho, hoje Associação Brasileira dos Amigos do Vinho. Também é desde sempre um conhecedor da gastronomia, seja alta ou baixa, como queiram, mas sempre impecável.
Até por este detalhe é um dos nossos mais admirados acadêmicos da ABG-Academia Brasileira de Gastronomia, sempre nos orientando e ensinando. Pois bem, amigo do Oscar Guglielmone, tinha(ou ainda tem) em seu poder garrafas enviadas direto da Adega Medieval para sua apreciação e considerações, tal era a amizade.
Muitas destas garrafas o Ennio Federico, com sua gentileza e amor aos vinhos, cedeu para degustações, para textos dos jornalistas apaixonados pelo tema, como em duas ocasiões que me lembro, uma delas participei e outra não.
A primeira foi para o texto do querido amigo Luiz Horta, à época no jornal O Estado de São Paulo, degustação esta que infelizmente não participei, mas muito festejada, sobre os vinhos do Guglielmone. A segunda, também com o Horta, para o 7º Paladar Cozinha do Brasil, e nesta eu estava, com vinhos de safras antigas cedidas pelo Ennio.
Voltando ao Guglielmone, motivado pela postagem do mano Ennio Federico no Facebook(Ennio quase não aparece por lá), sobre a poesia enviada desde Viamão, apelei para a Gabriela, filha de vinhateiro filósofo, ou seria o contrário? Recebi algumas fotos digitalizadas que tentarei postar também, mas antes, o texto do Ennio Federico com a poesia do Oscar Guglielmone que me veio também por e-mail depois de publicada pelo querido Ennio:
“Mano,
NEBBIOLO ADEGA MEDIEVAL 1985 – OSCAR GUGLIELMONE
Oscar Guglielmone, produtor do Nebbiolo em Viamão, RS, era uma figura polemica.
Vinhateiro autodidata, poeta, amigo generoso de uns, mas rude e desbocado com
quem não gostava. Depois do 1° lugar com Nebbiolo na Olimpíada Nacional do Vinho
em 1983, arranjou muitas encrencas com concorrentes inconformados em perder para
vinhos elaborados numa cantina rustica e em precárias condições. Gostava mesmo era
de receber amigos num galpão de sapé ao redor de uma fogueira conversando sobre
vinho, onde bebiam durante horas com embutidos típicos da região e macarrão
caseiro feito por Dna. Salete, sua esposa”.
Este foi o texto publicado no Facebook:
“OSCAR -Na década de 1980, época de fundação da SBAV, formávamos um grupo de animados enófilos comemorando o aparecimento simultâneo de vários vinhos brasileiros feitos a partir de uvas viníferas. As multinacionais Almadén, Chandon, Martini&Rossi e poucas nacionais foram responsáveis por essa iniciativa que já ocorria há bom tempo em outros países do chamado novo mundo vinícola.
Destas últimas gostaria de destacar a Adega Medieval do vinhateiro e filosofo Oscar Guglielmone, morto em 1993, que produzia excelentes varietais. Os elogios dos consumidores aos seus vinhos de garagem foram confirmados em 1983 quando o Nebbiolo de Viamão foi eleito pelo extinto e respeitado Guia Quatro Rodas como o melhor vinho tinto brasileiro.
Há uma razão para a escolha de Oscar Guglielmone e não outros nomes igualmente importantes da vitivinicultura brasileira daquela época. Não foi pelo vinho. No período de minhas visitas a Viamão consegui resolver, graças a amigos, um problema que o atormentava. Desde então Oscar passou a me enviar diversos vinhos com rótulos autografados e numa das vezes um poema! Sim, Oscar também era poeta. Há alguns dias arrumando coisas antigas encontrei o original que passo a compartilhar com os facebookers.
“A MORTE E O VINHO
As uvas na vinha morrem vivendo
nas moendas o vinho floresce nascendo
Morremos vivendo com o tempo que nasce
criando-se tempo para viver
Que pena não posso o tempo deter
Assim vou vivendo até envelhecer
Nas pipas o vinho criando-se em tempo
Espera que passe para viver
Assim vai crescendo até envelhecer
Juntos nascemos, crescemos, vivemos esperando viver
até que o tempo, que não conhecemos, faz-nos morrer”
Divagações vínicas
Viamão, 2/11/1985
Oscar Guglielmone
Divagações vínicas Viamão, 2/11/1985 Oscar Guglielmone
Poderão ver a postagem original aqui
Gabriela Guglielmone me contou por e-mail: “O pai tinha uma empresa em Porto Alegre de representação de produtos hospitalares, tinha uma vida confortável financeiramente, e quando casou com a minha mãe resolveu mudar de vida no sentido de buscar a realização dele, minha mãe foi muito parceira, fomos morar num sítio em Viamão que na época não tinha nem luz e começaram do zero fazendo vinho com toda a família, uma grande aventura para um cara que na época tinha 50 anos, foi um louco mas deu certo!”
“Sim, a mãe trabalhava muito, construíram a cantina juntos, eu achava muito lindo quando meu pai gaúcho e genioso e as vezes meio machista dizia que “por trás dele tinha uma grande mulher que era a minha mãe Dna. Salete”.
A generosidade do enófilo Ennio Federico não tem limites, aqui a degustação histórica que eu gostaria de ter participado. Obrigado Ennio Federico por sua amizade e ensinamentos. Obrigado Gabriela Guglelmone pelo pronto atendimento aos meus pedidos, e desculpe se esperava texto melhor, mas é de coração, e descrevo o Ennio para que entendas por que seu pai se tonou tão amigo dele.
As fotos levam o crédito de Gabriela Guglelmone. Crédito da foto de capa-Adega Medieval Diário de Viamão.
Até o próximo brinde!
Álvaro Cézar Galvão