Meninas e meninos,
Recebi este texto muito interessante para todos que têm nos vinhos seu alvo profissional, e o transcrevo na íntegra. Texto: Emília Freire l Fotografia: Must – Fermenting Ideas.
Como atrair os millennials para o vinho?
Como “ganhar” as gerações mais novas, principalmente os millennials, para o consumo do vinho, uma bebida com a qual não se identificam à partida, foi um dos temas mais focados na Wine Summit, que juntou em Cascais no início de junho vários especialistas mundiais do setor. As vendas online, o enoturismo e a crescente influência da China também estiveram em destaque.
De 7 a 9 de junho o Estoril foi o centro do mundo do vinho. A MUST Wine Summit, no Centro de Congressos, reuniu os líderes da indústria do vinho para debater o setor, as principais tendências e desafios. Uma oportunidade única para ouvir e discutir com os mais reconhecidos especialistas mundiais do vinho e que atraiu 464 participantes, de 21 países, em representação de 43 marcas.
Enoturismo; Vinhos Naturais; Tendências do Consumo; Vendas Online; Cortiça; Castas Antigas, Autóctones e Desconhecidas; Comunicação e Influência Asiática foram alguns dos temas escolhidos pelos organizadores – o jornalista Paulo Salvador e o crítico de vinho Rui Falcão. Destes, destacamos a comunicação e tendências com o consumidor, principalmente com os millennials, as vendas online, mas também a importância crescente do enoturismo e a influência asiática.
Lulie Halstead, CEO da Wine Intelligence, salientou que os millennials (nascidos entre 1981 e 1995 e que são cerca de 30% da população dos EUA, por exemplo) não têm tanto dinheiro para gastar como a geração X (1961-1980) ou os baby boomers (1945-1960) mas procuram no vinho a mesma elegância e seriedade.
Também Felicty Carter, editora executiva da Meininger’s Wine Business International referiu que «os millennials são o futuro, mas não vai haver tantos millennials como há baby boomers», apesar de poderem ser o futuro da indústria do vinho, esta é uma geração que vai «gastar e comprar menos», por questões financeiras (menos estabilidade laboral) mas também de saúde, uma vez que a geração mais nova bebe e fuma menos. Nesta altura, são precisamente os baby boomers, que mais compram vinho.
Experiências e histórias
Para os millennials o vinho é uma bebida “estranha”, pelo que a educação tem um papel fundamental, mas Felicity Carter salientou que «as pessoas não querem ser tratadas como wine geeks». As pessoas têm dificuldade em provar vinhos e não gostam de ser tratadas como peritas em vinhos, sobretudo num contexto de enoturismo, mas defendeu que «o enoturismo é uma das formas de melhor aproximar o vinho de consumidores mais jovens (e não só)».
Já Natalia Velikova, professora na TexasTech University e investigadora na área do enoturismo, marketing de vinho e comportamento do consumidor, tinha dito no primeiro dia da Wine Summit que «a educação é chave para que os millennials gostem de vinho», mas assegurou que esta geração vai sempre dar mais valor à experiência. O segredo está no saber contar uma boa história, frisam as oradoras.
Novas formas de “beber” vinho
A pesquisa da Wine Intelligence sobre a geração pós-1985 revela mudanças significativas no comportamento dentro da categoria de vinho, o que pode vir a ter uma influência a longo prazo, referiu Lulie Halstead. Nos estudos da para o relatório Global Consumer Trends 2017, observou-se que os millennials se destacam em duas tendências denominadas “Individual” e “Ativar”.
A tendência “Individual” denota uma preocupação com a autoexpressão e personalização: os millennials gostam de produtos que digam algo sobre si mesmos. Já a tendência “Ativar” aposta no envolvimento das pessoas em formas incomuns, tirando o produto do seu contexto natural. Como por exemplo o pop-up finest wine bar da Tesco ou o projeto português Wine to Eat, entre muitas outras ideias e produtos que têm vindo a ser lançados, seguindo esta tendência e tentando ganhar novos consumidores para o vinho.
As duas tendências estão preocupadas com o “Eu” e com a “Espontaneidade”, pelo que não será de estranhar que os millennials não apareçam tão destacados no relatório na tendência “Comunidade” (apoiar organizações e atividades comunitárias locais), que exige um comportamento mais planeado e situações de vida estáveis, mesmo que uma das ideias associadas aos millennials seja precisamente que para eles o apoio aos valores da comunidade é primordial.
O relatório da Wine Intelligence mostra também que no que respeita ao vinho os millennialsnão são todos iguais. Há os “Epicuristas”, que veem o vinho como uma bebida “adulta” e procuram ativamente informações sobre o vinho, são tipicamente aventureiros e exploram além do mainstream. Depois há os “Developers” que estão abertos à influência, mas são mais avessos ao risco. De vez em quando, tentarão novas variedades e regiões de origem, mas, de outro modo, manterão o seu menu de bebidas principais como uma escolha segura. E por último os “Periféricos” que são consumidores passivos, não compreendendo – e muitas vezes não se importando em entender – o que bebem.
Gerir presença online para vender mais
Falando agora de vendas online, plataformas como a Vivino, a Wine-searcher e a Wine.com não são apenas para uso dos consumidores, podem, e devem, ser usadas pelos produtores para terem uma maior e melhor presença online e assim venderem mais, defendeu a cofundadora da Enolytics.
Cathy Huyghe, também colunista da forbes.com e da inc.com, explicou à DISTRIBUIÇÃO HOJE, à margem da Wine Summit, que o seu objetivo foi “mostrar aos produtores como podem vender melhor os seus vinhos online, utilizando big data para que possam aumentar a sua presença na Internet” salientando que “é isso que fazemos na Enolytics, fazemos parcerias com as plataformas de vinho, como a Wine-searcher.com, a Vivino e a Wine.com, onde vamos buscar dados para identificarmos o que o produtor pode fazer para estar bem apresentado nestes sites” e frisou: “e é bastante, bem mais do que a maioria dos produtores julga”.
A especialista adiantou que sites como o Wine-searcher.com se orgulham de serem precisos nos dados que apresentam, por isso estão abertos a que os produtores enviem informação e corrijam o que não estiver bem “por isso é muito importante que os produtores verifiquem como estão apresentados nestes sites, porque é a primeira montra dos seus vinhos aberta para o mundo inteiro”. E muitos não o fazem, principalmente, porque pensam que são sitescom informação fornecida apenas pelos consumidores, “o que não é verdade”.
A título de exemplo Cathy Huyghe afirmou que “o Vivino tem cerca de 24 milhões de downloads anualmente em todo o mundo e é, de facto, uma aplicação dirigida essencialmente aos consumidores, mas o produtor deve fazer um test drive à app, procurar pelos seus vinhos lá e ver se a informação está correta. Se há 24 milhões de pessoas a procurarem vinhos, alguma vai procurar pelos seus, certo?” E acrescentou que “no futuro será possível também comprar vinho através da Vivino”.
China vai ser fundamental no setor
Também à margem da Wine Summit falámos ainda com dois dos oradores: Huiqin Ma – professora na China Agricultural University em Pequim, especialista em marketing de vinho e em biologia molecular da uva –, e Stephen Li – um dos novos autores emergentes da China, conhecedor dos diferentes estilos de vinho chinês e dos diferentes terroirs – e ambos não têm dúvidas que a Ásia, principalmente, a China vai ter uma grande influência no mercado mundial do vinho, ao nível do consumo mas também da produção.
Stephen Li disse que “os chineses não sabem como apreciar o vinho, não faz parte da sua cultura, por isso escolhem principalmente pelo preço e notoriedade da marca”, mas frisou que “a qualidade dos vinhos chineses têm vindo a aumentar e desde que o vinho de um dos produtores nacionais ganhou uma medalha de ouro num importante concurso internacional tem havido ainda mais investimento dos produtores”. O wine writer explicou-nos que a maioria dos vinhos produzidos na China são de castas internacionais, mas “também temos castas autóctones que são produzidas em algumas áreas onde as variedades internacionais não se dão e também no sudeste do país onde fazemos ice wine tinto, por exemplo”.
Ao nível do consumo, Stephen Li salientou que “mesmo que uma pequena percentagem de chineses beba vinho de qualidade, o número é muito significativo”, devido ao peso demográfico do país e frisou que o interesse e conhecimento sobre o vinho tem vindo a aumentar exponencialmente: “todos os anos, pelo menos, 30.000 pessoas toram cursos de vinho que dão certificados em instituições locais ou internacionais”.
Huiqin Ma alertou, por seu lado, que embora os chineses estejam mais educados acerca do vinho, “o fator mais importante é económico: os chineses têm-se tornado mais ricos nos últimos 30 anos o que lhes permite procurarem coisas diferentes e usufruírem mais e abre a possibilidade à parte de lifestyle do vinho”. A professora disse ainda acreditar que “a China será o mercado mais promissor no futuro, embora o vinho não seja uma bebida diária, mas o consumo poderá chegar aos seis a dez litros por ano, com o vinho a ficar mais imerso na cultura”.
Sobre a possibilidade de a Ásia vir a poder influenciar o estilo de vinho no futuro, uma vez que o seu ‘gosto’ é diferente, Huiqin Ma defendeu que “isso é uma falsa questão, uma vez que os chineses bebem todos os tipos de vinho e que o paladar educa-se e evolui. E as pessoas e toda a sociedade chinesa estão em mudança”.
Até o próximo brinde!
Álvaro Cézar Galvão